Resumo |
Silva (2012) conduziu um estudo acústico sobre as laterais do português brasileiro (PB) visando a verificar a existência de uma lateral palatal em oposição a uma lateral alveolar na língua, utilizando pares mínimos como filha/fila, ralhou/ralou ou lhama/lama, por exemplo, sempre que possível. Mais ainda, o estudo objetivava investigar a eventual ocorrência de uma lateral palatalizada. Tratava-se, em suma, de responder à pergunta: existe, em PB, uma lateral palatal de fato? Ou o que há é a realização de uma lateral alveolar, com uma articulação palatalizada, secundária?
Os dados analisados mostram ocorrência restrita da lateral palatal, tal qual descrita por Silva (1996), para o PB, com um estado estacionário em que se vê um F2 alto e próximo de F3, mas distante de F1 ladeado por longos momentos de transição, fato interpretado pela autora como a pista acústica de um lento movimento de dorso de língua que se elevaria em direção ao palato. Em Silva (2012), a lateral palatal é produzida sobretudo num contexto que favorece a hiperarticulação dos segmentos, isto é, em posição inicial de palavras e na sílaba que carrega o acento lexical, em dados como lhama, lhasa ou filhote. Por outro lado, em posição átona um contexto menos favorecedor de hiperarticulação ocorre majoritariamente a lateral palatalizada, cujas pistas acústicas se assemelham, ao mesmo tempo, às da lateral alveolar e às da lateral palatal. Ou seja, verifica-se um segmento de aspecto contínuo, sem as grandes transições da lateral palatal, mas com F2 de valor alto, próximo de F3 e distante de F1.
Os resultados obtidos, portanto, sugerem uma interação entre o nível prosódico e o segmental na realização da lateral no PB, de modo que há uma tendência à realização da lateral palatal em contextos favorecedores de hiperarticulação.
Como a variabilidade na produção dos sons laterais parece sujeita a um fato gramatical do PB sua estrutura prosódica é preciso fornecer uma representação fonológica que dê conta dessa variabilidade. O objetivo deste trabalho, assim, é apresentar tal representação, baseada na Fonologia Gestual (Browman & Goldstein, 1992). O argumento central, que embasa a representação, é a de que as laterais são constituídas por uma constelação de gestos articulatórios. Esses gestos são os mesmos para todos os segmentos laterais, mas as maneiras distintas pelas quais se organizam no tempo engendram as diferentes realizações, tal qual se verifica na descrição acústica.
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