Resumo |
Num contexto de expansão marítima, os relatos de viagens publicados expandem-se através da Imprensa dando acessibilidade ao Novo Mundo. Há exigências de historicidade e mecanismos de controle, como afirma Costa Lima (2009) para que estes relatos sejam considerados reais. Em virtude disso, as narrativas precisavam ser escritas em primeira pessoa, com uma linguagem simples e descrição detalhada para que o leitor fosse persuadido de que o texto diante dos seus olhos era verdadeiro.
No romance de Daniel Defoe, Robinson Crusoe (1719), o editor afirma que a vida de Crusoe é uma história de fatos e por isso suas aventuras são dignas de serem tornadas púbicas além de servirem de instrução para os leitores. A exaltação da veracidade e o repúdio à ficção correspondem ao que Michael Mckeon (1985) denomina de questions of truth, uma crise epistemológica sobre como expressar a verdade numa narrativa segundo um contexto sócio-histórico de secularização e empirismo.
O místico e o imaginário eram completamente reprimidos e considerados relatos ficcionais. A afirmação do novo gênero literário, o romance, fez com que surgisse a distinção entre novel (romance) e romance (relato ficcional/ romance de cavalaria). Para negar a ficcionalidade da obra era necessário utilizar-se dos mesmos artifícios discursivos, e até mesmo paratextuais, dos relatos e coletâneas de viagens sobre o Novo Mundo que circulavam nos séculos XVII e XVIII.
O presente trabalho propõe analisar as estratégias discursivas utilizadas por Daniel Defoe para ofuscar a ficcionalidade do romance, de forma que o leitor acreditasse que Robinson Crusoe era o autor e narrador-personagem das aventuras descritas, ou seja, que o livro era sua atuobiografia. A valoração de um status de real e o diálogo com narrativas de viagens, fez com que as fronteiras entre romance e cartas de viagem, ou seja, as fronteiras entre real e ficção se tornassem indeginidas.
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