Resumo |
Nesse trabalho, objetivo empreender analises de imagens da manifestação Marcha das Vadias, nas quais o corpo feminino se entrega a dizeres de protesto e de indignação social. Tomo o corpo não enquanto uma passividade carnal, um sistema de orgãos que apresentam movimentos voluntários e involutários, mas sim enquanto uma instância discursiva. Instância essa que se inscreve, num tempo e espaço, enquanto um conjunto (des)ordenado de acontecimentos (discursivos/enunciativos) que emergem por uma relação de alteridade. O dizer, por conseguinte, encontra-se ancorado a uma dada movimentação do sujeito entre posições. O que não se pode perder de vista é que essa movimentação se situa a partir de outros sujeitos. Por ser inviável pensar o sujeito isoladamente, numa perspectiva discursiva, então, pensar a subjetividade implica em pensar numa relação constituínte e constitutíva do sujeito com o(s) outro(s). Em que medida essa relação com o outro afeta a constituição corporal do sujeito? Essa problematização deve balizar o meu olhar por apresentar uma finalidade genealógica e ética. Uma via de análise dessa problematição tem sido propor um diálogo entre o campo da Análise do Discurso, especificamente a teoria de Foucault, e a teoria de Nietzsche. A partir de um diálogo entre esses dois autores, pode-se pensar que há uma relação entre o corpo, com os elementos que dele emanam, e a realidade enquanto um ponto de impossível, de intocável e, por conseguinte, de um não-sentido. Desse modo, esse trabalho caminha em direção à possibilidade de um corpo que se entrega ao dizer. O imbricamento entre o corpo feminino e o dizer adquire então um status visceral e singular na manifestação Marcha das Vadias. Segundo Nietzsche, os signos - e, por conseguinte, o dizer grafado no corpo das manifestantes - são nada mais do que uma criação que emerge numa cena de forças dominantes e na qual uma Vontade de Poder anseia manter as redes de força. Desse modo, tem-se que o imbricamento entre corpo e discurso (e, sobretudo, a partir da relação com outros corpos) demarca relações de poder em práticas sociais. Nesse sentido, pode-se chegar a conclusão de que na interpretação dos corpos femininos na manifestação, os dizeres, presentes nesse corpo-suporte, historicamente impulsionados, emergem em redes de prescrição e ditam uma resistência a determinadas práticas corporais como, por exemplo, a violência física, psicológica e sexual. |