Resumo |
O objetivo deste trabalho é analisar a aquisição de linguagem a partir dos processos de bootstrapping prosódico, sintático e semântico em testes presentes na literatura sobre o assunto (GOUT & CHRISTOPHE, 2006; STEEDMAN, 1996; BLOOM 1999, entre outros). O conceito de bootstrapping denota o processo de desencadeamento da aquisição a partir de informações linguísticas que engatilham o aprendizado, tais como pistas prosódicas e fonológicas do sinal de fala, percepção semântica dos contextos de enunciação e análise sintática inicial. Muitos autores postulam que existe uma hierarquia entre as pistas usadas pela criança para iniciar a aquisição, ou seja, de que inicialmente ela presta atenção em apenas um tipo de informação no input, seja na prosódia, sintaxe ou semântica, para somente mais tarde prestar atenção em outro, para a aquisição de componentes mais refinados da gramática, e assim por diante (CHRISTOPHE ET. AL., 2008). Esta tendência gera o chamado bootstrapping problem (BLOOM, 1999; CHRISTOPHE ET. AL., 2008), em que se pergunta o que a criança usaria primeiro na aquisição: se pistas sintáticas, prosódicas ou semânticas. Tentarei mostrar, neste trabalho, que a busca pelo estabelecimento de uma hierarquia traz certas circularidades inevitáveis: a posição sintática dá pistas sobre o significado de uma palavra, mas não é possível conhecer a correlação do significado com a posição sintática sem a informação semântica (GLEITMAN, 1990); da mesma forma, a informação prosódica é necessária para a aquisição da sintaxe, mas sem a informação sintática não há como ocorrer a transposição do nível fonético/fonológico para o nível de representação formal. Por conta disso, parte-se da hipótese de que há uma coocorrência entre os tipos de bootstrapping desde o início da aquisição. De acordo com Christophe et. al. (2008), a criança faz uso ao mesmo tempo de informação prosódica para a representação prelexical, de interpretação semântica de alguns itens lexicais e de informação sobre a estrutura sintática para configurar a estrutura argumental. Evidências desta coocorrência de boostrappings são encontradas em trabalhos como o de Katz, Baker e Macnamara (1974), onde se observa que crianças de apenas dezessete meses possuem um rico entendimento do mapeamento entre sintaxe e semântica, sendo capazes de diferenciar um substantivo contável de um NP lexical, e de Hirsh-Pasek et.al. (1985), em que crianças também de dezessete meses mostraram entender a ordem de frases, assim como sua significação semântica, distinguindo os papéis de agente e paciente. |