Resumo |
Segundo Maingueneau (2004), a cena de enunciação de um discurso é composta por três cenas: a cena englobante, a cena genérica e a cenografia. A cena englobante diz respeito ao tipo de discurso, correspondendo ao seu estatuto pragmático (por exemplo: discurso literário, discurso religioso, discurso filosófico, discurso publicitário). A cena genérica, por sua vez, refere-se ao contrato associado a um determinado gênero (editorial, sermão, guia turístico, visita médica, receita, etc.). Por fim, há a cenografia, a cena construída pelo próprio texto, que é oferecida ao enunciatário como se o texto dela se originasse. Trata-se, portanto, de uma cena que não é necessariamente imposta pelo gênero e que pode variar bastante, conforme o tipo de discurso (por exemplo, uma peça publicitária pode ser enunciada por meio de uma aula, de uma conversa telefônica, de uma descrição científica, etc.). Considerando-se a noção de cenografia, neste trabalho, analisam-se obras de autoajuda voltadas especificamente para mulheres. De modo geral, essas obras se destinam a apresentar um conjunto de orientações para o sucesso de suas leitoras, na realização de seus mais diversos objetivos. A análise, que está centrada especialmente nas capas de algumas obras de autoajuda para mulheres, procura avaliar em que medida elas se valem de cenas que ajudam a reforçar e/ou transformar estereótipos femininos. De acordo com Amossy e Pierrot (2001), os estereótipos são representações cristalizadas sobre um grupo social, são esquemas culturais preexistentes, imagens fictícias, que expressam um imaginário social. Dadas as obras que constituem o córpus, que são obras que estão circulando no mercado atualmente, verificamos que o discurso de autoajuda para mulheres ajuda a reforçar certos estereótipos que desvalorizam socialmente a mulher, associando-a ora a velhos papéis sociais (de mãe, de esposa e de responsável pelos cuidados com a família), ora à imagem de uma pessoa insegura. Evidencia-se, assim, a contradição própria ao discurso de autoajuda que propõe à mulher um padrão de comportamento mais condizente com a sua emancipação ao mesmo tempo em que colabora com a reprodução de velhos estereótipos femininos. |