Resumo |
Este trabalho privilegia a focalização da língua como propriedade mental dinâmica, que constantemente retorna sobre si mesma e se reconstrói (Humboldt, 1836/1990:65). Observa-se o fenômeno da concordância para formular hipóteses de como se dá seu funcionamento no plano da elaboração cognitiva, considerando o contexto social, coparticipante dessa construção. Apoiamo-nos na abordagem da língua como multissistêmica, desenvolvida por Castilho (2010), segundo a qual a língua é um conjunto de produtos e processos governados pelos dispositivos sociocognitivos de ativação, reativação e desativação de propriedades dos quatro subsistemas da língua: gramática/ gramaticalização; semântica/semanticização; léxico/lexicalização; discurso/discursivização.
Os quatro sistemas são regidos por um dispositivo sócio-cognitivo que opera sobre a língua, ativando/reativando/desativando as propriedades lexicais, semânticas, discursivas e gramaticais. São governados por esse dispositivo, que tem caráter pré-verbal. Este dispositivo é social porque é baseado em uma análise continuada das situações que ocorrem em um ato de fala, e é cognitivo porque lida com categorias cognitivas tais como visão, espaço, tempo, movimento. Além disso, os quatro sistemas são organizados pelo que Castilho chama de princípio da projeção (no sentido de lanço, arremeço).
A atuação do princípio de projeção no sistema do discurso, por exemplo, dá como resultado a construção do texto (Jubran & Koch 2006). A concordância, que se materializa no texto, é entendida como uma das manifestações desse princípio, podendo ser articulada tanto pelo sistema gramatical, quanto semântico e discursivo. Assim, alguns episódios de fala ou escrita que não correspondem à concordância padrão podem ser reveladores da manifestação do sistema semântico ou discursivo na sua elaboração.
Os dados, retirados do corpus do projeto temático de pesquisa Para a História do Português Paulista a partir de uma seleção qualitativa, estão a serviço de mostrar a multissistemacidade da língua - são reveladores de que ora se projeta um componente discursivo para formar a concordância, ora um componente semântico, ora gramatical. A partir das análises, buscamos exemplificar o princípio de projeção, atuante na formulação da concordância.
Referências Bibliográficas
CASTILHO, A. T. de (2010) Nova Gramática do Português Brasileiro. São Paulo: Contexto.
HUMBOLDT, W. (1836/1986) Sobre la diversidad de la estructura de lenguaje humano y su influencia sobr el desarrollo spiritual de la humanidad. Trad. Ana Agud. Barcelona/Madrid: Anthropos/Ministerio de education y Ciencia.
JUBRAN, C. & KOCH, I. (org.) (2006). Gramática do português culto falado no Brasil, vol.1, Construção do texto falado. Campinas: Editora da Unicamp.
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