Resumo |
O Archive de Saussure 374 é um conjunto de manuscritos, provavelmente iniciados a partir de 1877, em que é possível encontrar anotações de Saussure sobre diversos temas. Neste complexo universo de formulações, destacamos o manuscrito Classes Morphologiques, texto em que Saussure trata da relação do sujeito falante com os grupos associativos de palavras, inconscientes por serem oriundos da língua, e o discurso, "o domínio do consciente para os fatos de linguagem" (Saussure, Arch. de Saussure 374-2, fls. 63-64; trad. nossa).
Para o genebrino, o sujeito falante coloca em jogo os grupos associativos inconscientes no campo sintagmático, ao se expressar pelo discurso; e, ao mesmo tempo, ao executar a língua pelo discurso, ele se vale de sua atividade criativa e consciente: "A realidade dos grupos só está, portanto, no inconsciente. (...) − grupo cuja a realidade se traduzirá (...) pelos seus efeitos criativos no discurso" (op.cit.). Reencontramos, tempos depois, a oposição entre consciente e inconsciente na Primeira Conferência na Universidade de Genebra, em 1981, ocasião em que Saussure questiona: os fatos linguísticos podem ser tidos como resultado de atos de nossa vontade?". Para ele, há muitos graus conhecidos na vontade consciente ou inconsciente", e destaca o ato linguístico como "o menos refletido, o menos premeditado e, ao mesmo tempo, o mais impessoal de todos" (Engler, 1990, p.06; trad. nossa).
Surge a questão: se o ato linguístico é o menos refletido, como o sujeito falante executa a sua atividade criativa discursiva, como descrito em Classes Morphologiques, por meio de atos linguísticos irrefletidos? A teorização saussuriana aponta para uma resposta que destaca a massa de falantes: as convenções, impostas pela língua à massa, impedem que o falante exerça plenamente a atividade criativa consciente − é a ação da ordem própria da língua sobre a vontade individual.
Neste trabalho, apoiados especialmente em Engler (1989;1990), Pétroff (2004) e Arrivé (2010; 2012), analisaremos o manuscrito Classes Morphologiques para dele retirar conclusões teóricas que ajudem a entender a noção de sujeito falante na obra de Saussure, em contraste com outras formulações sobre o sujeito falante, as quais aparecem em diferentes períodos de sua obra, como nas conferências de 1891 e nos cursos de Linguística Geral, ministrados por Saussure entre 1906 a 1911. (O trabalho é realizado com apoio do CNPq). |