Resumo |
Um dos conjuntos de dados mais representativos da interface morfologia-sintaxe é o dos compostos VN, amplamente encontrados nas línguas românicas (e.g., pb. limpa-vidro(s); it. lustra-carpe engraxate; es. rompecabezas quebra-cabeça; fr. lave-vaisselle lava-louças). Seu aspecto fronteiriço entre um composto e um sintagma vem levantando um conjunto de questões acerca de sua estruturação sintática (i.e., como e em que ponto o sintagma verbal deve nominalizado) (cf. BOK-BENNEMA & KAMPERS-MAHNE, 2005; SCHROTEN, 2010; BISETTO, 2004), a fim de abarcar as diferenças específicas às línguas em que esses dados aparecem.
No português brasileiro (PB), vimos elencando as características morfossintáticas que definem a composição VN, a partir de um trabalho comparativo entre as línguas românicas, chegando à conclusão de que esses dados apresentam uma formação mais uniforme do que no italiano e no espanhol, no que diz respeito (i) à categoria gramatical do composto, (ii) aos tipos de verbos empregados na composição, (iii) ao tipo de relação argumental entre o verbo e o nome e (iv) à (im)possibilidade do nome interno ao composto ser um antecedente de uma anáfora lexical.
Dentre essas características, duas delas, (iii) e (iv), revelam diferenças estruturais no PB, uma vez que, nessa língua, o constituinte nominal é somente interpretado como argumento interno do verbo, enquanto que no italiano há compostos VN em o nome é um argumento externo (e.g., marcapiedi calçada; batticuore ansiedade), e, além disso, a possibilidade de se recuperar o nome interno ao composto em relações de antecedência, inexistente em línguas como o italiano e o espanhol (e.g., pb. Esse [tira-manchasi] tem que ser usado em cima [delas]i bem rápido; es. *Este señor es [limpia-botasi] y [las]i trata bien).
Para abarcar tais diferenças em uma única análise, contraporemos, no presente trabalho, as visões de Zhang (2007), que trata a composição como resultado direto da concatenação de raízes (i.e., não há uma nominalização de uma estrutura verbal), e a de Franco (2012), que acredita ser a composição VN o resultado da nominalização de uma estrutura relativa (i.e., CP). Mostraremos que a primeira visão apresenta problemas em acomodar as características (iii) e (iv), tanto pela perda das relações de predicação, quanto pela impossibilidade de permitir a recuperação anafórica, chegando à conclusão de que a proposta de Franco (2012) inova pela capacidade de envolver a composição VN em diferentes línguas, o que endossaremos a partir de evidências presentes nas relações de concordância e nos dados com leituras não-composicionais.
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