Resumo |
Este trabalho filia-se aos estudos desenvolvidos pelo grupo de pesquisa Estudos Estilísticos, vinculado ao Programa de Mestrado Acadêmico em Linguística da Universidade Cruzeiro do Sul, dentro da linha de pesquisa Estudos Estilísticos: discurso, gramática e estilo. Considerando-se a grande abrangência da área, optamos por desenvolver algumas reflexões relacionadas à Estilística da Enunciação, tendo por corpus o conto Miopia Progressiva, de Clarice Lispector.
O conto Miopia Progressiva, publicado na coletânea Felicidade Clandestina (1998) apresenta, através das reflexões e conjecturas de um menino sobre os efeitos que sua aparente inteligência causa nas pessoas que o rodeiam, uma visão paradoxal da própria miopia, pois, enquanto a principal característica dessa deficiência visual é a dificuldade para se enxergar objetos ou pessoas à distância, é a medida que se afasta que o personagem adquire a capacidade de observar com maior clareza os fatos que o rodeiam.
A proposta de análise selecionada para este estudo objetiva, inicialmente, destacar na constituição da narrativa, as diversas faces que o eu do protagonista seleciona para confirmar a imagem que os outros fazem dele, estabelecendo, por esse recurso, um intenso diálogo dentro de um texto totalmente constituído em terceira pessoa. Num segundo momento pretende-se observar o gradual aprisionamento do personagem em face das múltiplas possibilidades que as conjecturas sobre seus atos podem ter sobre aqueles que o rodeiam. É nesse momento que a visita a uma tia desconhecida, rompe com o círculo vicioso no qual o personagem se envolve.
Para tanto, partimos da constituição narrativa e das marcas de subjetividade, implícitas ou não, para desenhar o gradual processo de tomada de consciência do eu, na mesma proporção que sua acuidade visual diminui.
Como embasamento teórico, fazemos uso, inicialmente, de algumas teorias relacionadas à Análise do Discurso de linha francesa, dos estudos de Bakhtin (2003, 2006, 2008) e Benveniste (1989, 1995) sobre a influência do outro no discurso e o dialogismo deste derivante, bem como de elementos relacionados à Estilística, observando as considerações de Rodrigues-Lapa (1998), Maingueneau (2001), Tavares (1996), Martins (2008) e Micheletti (2008) sobre o assunto.
|