Resumo |
Este trabalho tem por finalidade realizar uma leitura comparativa entre Estorvo, romance publicado por Chico Buarque em 1991, e Hotel Atlântico, romance publicado por João Gilberto Noll em 2004. Ambos os romances têm como protagonistas personagens geográfica e emocionalmente desnorteadas, que se encontram constantemente em trânsito, configurando-se como seres desterritorializados que buscam encontrar, em seu ininterrupto processo deambulatório, algo de que não têm consciência exata. Nessas caminhadas, que em certa medida aludem ao movimento errático do flâneur parisiense (BENJAMIN, 1989), ambos os protagonistas percorrem espaços citadinos e rurais. Segundo o senso comum e de acordo com uma ótica romântica entendendo-se romantismo como uma visão de mundo (LÖWY e SAYRE, 1995) locais campestres proporcionariam sensação de paz, de sossego e de tranqüilidade, ao paso que espaços citadinos seriam locais permeados de confusão, de balbúrdia, de desassossego e de violência (WILLIAMS, 1989). Isso não se verifica, no entanto, nesses textos de Chico Buarque e de João Gilberto Noll, uma vez que tanto o protagonista de Estorvo quanto o de Hotel Atlântico não se adaptam nem a cenários de contornos bucólicos, nem a cenários tipicamente urbanos, de maneira que jamais se identificam nem com um, nem com outro desses espaços. Permeando o enredo de ambas as obras, tem-se, ainda, o contundente retrato de questões atreladas à violência, à quase total incomunicabilidade entre os indivíduos e à impossibilidade da vivência de sentimentos de plenitude individual embora o retrato dessa vivência possa se configurar como algo presumido, como acontece ao final da narrativa de Hotel Atlântico. De um modo ou de outro, os dois protagonistas dessas obras parecem habitar e perambulam, sempre, por espaços urbanos e rurais (IGNÁCIO, 2010) cuja caracterização faz com que eles mais se assemelhem a não-lugares (AUGÉ, 1992), lócus em que o indivíduo jamais encontra satisfação, jamais encontra repouso. |