62º SEMINáRIO DO GEL - 2014 | |
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Título: | A arte de narrar para sobreviver: impactos da narrativa de si na construção identitária |
Autor(es): | Tatiana Piccardi. In: SEMINÁRIO DO GEL, 62 , 2014, Programação... São Paulo (SP): GEL, 2014. Acesso em: 21/11/2024 |
Palavra-chave | narrativa, narrativa, performatividade |
Resumo |
Este trabalho busca verificar, por meio da análise de relatos sobre dor e sofrimento, em que medida os respectivos enunciadores encontram alívio e recursos internos para refazer suas vidas por meio do processo de narrar. As reflexões propostas são desdobramento de duas experiências correlatas: (i) a observação das falas de mães/pais pertencentes a um grupo de apoio a pais enlutados, falas tais que promoveram um desenvolvimento favorável do luto; e (ii) o fato de esta pesquisadora ter tido a oportunidade de ser a coautora de uma história incomum: a de um transexual que decidiu realizar a cirurgia para mudança de sexo e resolveu escrever sobre sua dolorosa experiência de modo a transformar sua dor em narrativa. Em ambos os casos, observaram-se efeitos “curativos” e empoderamento identitário decorrentes da narrativização da dor. Nos dois casos, a narrativa parece constituir-se como bem mais do que uma possibilidade estrutural da linguagem, parece ser um fenômeno estruturante, que garante, por meio da agência dos sujeitos, expressão coerente e significativa e um sentido positivo para a difícil experiência. A performatividade da linguagem é aqui articulada e compreendida da perspectiva do filósofo da linguagem John L. Austin. Para Austin (1975), a linguagem não é simples representação de uma realidade externa ao sujeito, já que, para o autor, o sujeito é indissociável da linguagem que produz. Ao tomar a palavra, o sujeito faz mais do que traduzir uma realidade qualquer, ele realiza uma ação integrada a um mundo palpável e contingencial. Esta visão se alinha à de que o narrar é uma necessidade antropológica (PETIT: 2009), que emerge sempre que está em risco a identidade física, social, política e/ou espiritual dos sujeitos. A linguagem, sob a forma narrada, constitui-se assim como o lugar privilegiado da construção do humano. A análise dos fragmentos selecionados é feita a partir da compreensão de que as práticas linguísticas e os dados linguísticos estão socialmente situados e são constantemente agenciados pelos falantes. A perspectiva teórica que permeia toda a reflexão é a pragmática, que entende a linguagem como performativa (AUSTIN: 1975) e lugar por excelência da construção identitária (RAJAGOPALAN: 2003, 2006, 2010). Do ponto de vista da construção narrativa, este artigo leva em conta, sobretudo, as reflexões de Paul Ricoeur (2010), que nos leva a entender que uma nova configuração de mundo e de si mesmos é o que almejam os enunciadores dos textos em pauta. |