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Programação do 63º seminário do GEL


63º SEMINáRIO DO GEL - 2015
Título: Vozes sociais e horizonte social de valores na construção dos sentidos do signo ideológico “fanatismo religioso”
Autor(es): BENEDITA FRANA SIPRIANO. In: SEMINÁRIO DO GEL, 63 , 2015, Programação... São Paulo (SP): GEL, 2015. Acesso em: 05/05/2024
Palavra-chave Vozes sociais, Horizonte social de valores, Caldeiro
Resumo

Este trabalho toma como referencial teórico-metodológico a Análise Dialógica do Discurso, fundamentada a partir dos escritos do Círculo de Bakhtin: Bakhtin (2006, 2010, 2013); Volochínov (2011), Bakhtin/Volochínov (1990); e de estudiosos da teoria bakhtiniana, como Brait (2006, 2010) e Faraco (2009). O Caldeirão foi uma comunidade religiosa e agrária, desenvolvida entre os anos de 1926 e 1936, no Cariri cearense. Sob a liderança do beato José Lourenço, no sítio Caldeirão foi construída uma experiência de organização social comunitária em que os bens de produção e consumo eram coletivos. Com a justificativa de combate a um “reduto de fanáticos” e “foco de desordem”, o Caldeirão foi invadido por forças policiais, em 1936, a mando do governo do Estado do Ceará, com o apoio da Igreja Católica e das elites da região. Neste trabalho, objetivamos analisar, a partir das categorias vozes sociais e horizonte social de valores, a construção dos sentidos do signo ideológico “fanatismo religioso”, tomando como corpus o relatório oficial de polícia sobre a invasão ao Caldeirão. A abordagem bakhtiniana considera que os enunciados são permeados por uma multiplicidade de vozes sociais, que estão relacionadas a diferentes visões de mundo, pontos de vista, posturas ideológicas. Nessa perspectiva, os enunciados expressam sempre uma postura valorativa, um horizonte social de valores, que diz respeito a valorações, axiologias, construídas na dinâmica das interações sociais e compartilhadas por diferentes grupos humanos. Os sentidos ganham legitimidade, pois são produzidos a partir de um “chão comum” e possuem um “coral de apoio”, conforme discutido por Volochínov (2011). Assim, os sentidos do signo ideológico “fanatismo religioso” são construídos na historicidade, a partir do diálogo entre diversas vozes sociais. Em nosso corpus, vozes sociais que criminalizaram movimentos como Canudos e Contestado são retomadas no processo de construção dos sentidos sobre o Caldeirão. O olhar lançado pelas camadas letradas da sociedade sobre as manifestações da religiosidade popular, no final do século XIX e início do século XX, é pautado, sobretudo, por correntes de pensamento europeias cientificistas. Assim, a partir desse horizonte de valores, o “fanático” é o “outro”; é a representação daquilo que se opõe à ideia de civilização e desenvolvimento e, portanto, deveria ser combatido em nome do progresso. Assim, a escolha do adjetivo “fanático” atribuída ao povo do Caldeirão expressa um posicionamento e ecoa vozes que emergem a partir de um horizonte valorativo que compreende as manifestações da religiosidade popular como “expressão de atraso e ignorância sertaneja”.